A PUREZA DE SAMANÁ
Sabia que ia numa viagem de sol e mar, sabia que iria ter uma pulseira no braço a garantir-me tudo incluído, zero preocupações. Estaria nas mãos da Soltour, uma agência que já conhecia e que me assegurava qualidade. Contava com as tardes passadas na espreguiçadeira, as piñas coladas, os pores do sol tropicais. No entanto, à partida, não imaginava as aventuras que me esperavam, o mergulho na rica cultura dominicana, a extraordinária fertilidade da natureza, o encanto desarmante da província de Samaná.
Com todas as viagens que já fiz, seria de esperar que tivesse presente esta sabedoria simples: ir lá longe, atravessar oceanos e fusos horários, é sempre sinónimo de surpresa, de ganhar mundo. Ainda assim, foi preciso deslocar-me a esta península no nordeste da República Dominicana para recordar essa lição fundamental.
Há mais de quinhentos anos, na sua primeira viagem às Américas, Cristóvão Colombo chegou a parar aqui. Foi recebido com flechas pelos ciguayos, assim se chamavam os nativos. Esse foi o primeiro conflito de sempre entre europeus e americanos. Houve também a presença dos taínos, que povoaram uma boa parte das Caraíbas, também dos espanhóis e dos franceses. Já em meados do século XVIII, foi fundada Santa Bárbara de Samaná, aquela que, ainda hoje, é a capital da província.
Num território quase exclusivamente rural, coberto por selva frondosa, esta pequena cidade apresenta algumas ruas de ritmo urbano, trânsito, comércio mas, sempre com pacatez. Visitando o seu mercado, encontramos um cruzamento perfeito destes mundos: por um lado, a azáfama de vendedores e compradores, músicas a soarem de múltiplos altifalantes, motorizadas que passam a acelerar; por outro lado, a natureza abundante, as cores e os cheiros dos frutos. Sempre constante, o sorriso das pessoas, a alegria com que posam para as máquinas fotográficas dos gringos.
Na cidade, há a desordem urbanística, edifícios contíguos que parecem de planetas diferentes, há cores garridas em todas as paredes, exceto nas que estão em ruínas e, ao mesmo tempo, há a beleza da baía a amenizar e a uniformizar, há o malecón à espera de passeios ao fim da tarde, quando a temperatura for mais tolerável.
Entre os produtos tradicionais, destaco os charutos. Não apenas os perfumados charutos das marcas dominicanas de qualidade, mas também os mais artesanais, com direito à interessante visita a uma fábrica, onde se aprende o fundamental sobre essa ciência, onde podemos assistir ao manejamento de folhas que maturaram entre dois e três anos, pelo menos.
Também vale muito a pena passar pela Cooperativa de Mujeres hacia el Desarrollo de Samaná. Nesse caso, assistimos ao processamento do coco, uma das principais matérias-primas da região. O produto final é o óleo de coco. Podemos também adquirir uma garrafa desse óleo, sabendo que é totalmente puro. Levaremos ainda a inspiradora história desta associação de mulheres.
O piloto da embarcação chamava-se Ronny. Fiz uma boa parte da viagem ao lado dele, lá em cima. Saímos do porto em direção ao parque nacional Los Haitises. Nesse caminho de quase uma hora, foi-me contando alguns episódios dos seus vinte anos de experiência naquelas águas. Às vezes, em momentos inesperados, eu surpreendia-me com peixes que saltavam na distância. Ronny ria-se do meu espanto.
Los Haitises, parque nacional desde 1968, ocupa uma área com mais de seiscentos quilómetros quadrados, pertencente a três províncias distintas. Esta natureza é composta por bosque húmido subtropical, uma vegetação cerrada, muitos tipos de árvores e arbustos, enredados uns nos outros, inseparáveis pelo olhar destreinado. Esta é, também, uma área escolhida por diversas aves migratórias. Aqui residem durante parte do ano. É esse o caso da fragata, da garça real, do pelicano-pardo, entre muitas outras.
A partir da cabine de Ronny, enquanto observava esses impressionantes monumentos naturais, verde de vários tons sobre rocha sedimentada, escarpas assombrosas, havia quem dançasse merengue no convés.
Atracámos para visitar algumas grutas. Também aí, os virtuosismos da natureza impressionam. Logo a seguir, no entanto, os caiaques esperavam-nos para, com remadas coordenadas, se avançar entre os mangues. Ou seja, entre um ecossistema muitíssimo rico, composto por árvores resistentes ao sal, imagens de uma natureza exuberante, como no cenário de um filme.
No regresso, Ronny contou-me que, nos meses de janeiro, fevereiro, março e abril, leva grupos a ver as baleias que, durante a época de acasalamento, se reúnem nestas águas. Uma vez que não estive nesse período, visitei o Museu das Baleias em Samaná. Essa visita deixou-me com vontade de regressar para ver esses fascinantes animais ao vivo.
As praias, claro, são incontornáveis. A maioria dos hotéis dispõe de praia privada. Esse é o caso daqueles onde fiquei hospedado, o Bahía Principe, de Portillo, e o Viva Whydham Samaná. Num e noutro, há praia de areia imaculada, água com a temperatura perfeita, sem ondas, e o entorno de quilómetros é composto por incríveis paisagens de palmeiras.
Ainda assim, há praias na província de Samaná que merecem especial nota. A Playa Bonita é uma referência em todo o país, completamente à altura do nome com que foi batizada. É difícil decidir entre ficar na areia ou na água. Num e noutro lado, existe a possibilidade de absoluta descontração, o fim de todas as tensões acumuladas.
A Playa Rincón foi considerada pela UNESCO como uma das dez praias mais belas do mundo. Embora esses galardões sejam subjetivos, chegamos lá e entendemos as razões dessa distinção. Trata-se de uma praia especial na República Dominicana, o que já é dizer muito: areias brancas, mar azul-turquesa, palmeiras a perder de vista, a tranquilidade de uma paisagem quase deserta, as nossas pegadas a marcarem a areia virgem. Faz sentido que, com frequência, esta seja uma imagem que se associa ao paraíso.
O caminho para lá chegar testa a nossa vontade. No meu caso, fui a conduzir um buggy todo-o-terreno, no âmbito de uma das atividades extra que estes hotéis proporcionam aos seus clientes. Para além da adrenalina, houve também a oportunidade de testemunhar de perto as extraordinárias paisagens naturais e um pouco das condições e do quotidiano de quem vive à margem dos caminhos mais concorridos.
Na Playa Rincón, desagua o rio Caño Frio, um curso de admiráveis paisagens fluviais. Os locais preferem banhar-se aí, não só por se tratar de água doce, mas também por ser mais fresca.
Esta semana na Província de Samaná, ultrapassou muito o que esperava. Entre praias e cidade, entre repouso e aventura, com sorrisos permanentes, as expectativas iniciais eram grandes, mas tudo o que lá vivi foi muito maior.
Texto de José Luís Peixoto
Fotos de Patrícia Santos Pinto
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