JLP IN SITU
As casas, como peças de um jogo. Os telhados olham
para o céu, perguntam-lhe pela neve. Os telhados
parecem não entender o verão, este sábado, apesar
das promessas da luz, jovem manhã, comparável
a um tímido segredo. E os picos das montanhas, lá
longe, regiões inóspitas que nunca visitarei, mas que
posso avistar a partir desta varanda, conforme uma
ilusão imediatamente seguida de uma desilusão. E
procuro palavras na paisagem, e encontro um cartaz
escrito em polaco, zê depois do ésse — sz — zumbido
que não sei pronunciar, comparável talvez aos pneus
no alcatrão que, por vezes, ouço também na paisagem,
carros que seguem curvas nas montanhas, convictos
do seu caminho inequívoco, como um homem e uma
mulher lá ao fundo, na berma da estrada, vieram de
Varsóvia, têm um fim de semana inteiro, não sabem
o que hão de fazer com tanto tempo livre. O ar é frio
de limpo, atravessa os troncos retos dos pinheiros.
Quem saberá o que pensam os pinheiros?
José Luís Peixoto, inédito
Hotel Harnaś, Bukowina Tatrzańska (Polónia), 7 de Agosto de 2021
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OBSERVAÇÕES:
Eis o segundo poema que escrevo a partir de algumas das ideias que iniciei AQUI.
Neste caso, fiz o texto corresponder de um modo mais direto com o que estava a observar. Creio que essa característica se adequa mais a esta forma de escrita, no lugar e no momento. Ainda assim, não sei se manterei esta ligação tão clara nos futuros textos desta série.
Uma vez que, nas redes sociais, várias pessoas demonstraram interesse em partilhar textos escritos com princípios semelhantes a estes (escritos no lugar a que se referem, textos com princípios comparáveis aos dos desenhos dos Urban Sketchers), vou indexar estas publicações no Instagram com #escreverolugar e convido quem quiser juntar-se a usar esse hashtag para que seja fácil publicar-se e ler-se textos que tenham sido escritos a partir do desenvolvimento destas ideias.
Pessoalmente, continuarei a usar também o hashtag #jlpinsitu para agrupar os meus próprios textos e, assim, manter-me organizado. Irei igualmente continuar a publicá-los aqui, neste site, embora vá dando conta da sua existência, tal como das paisagens a que se referem, nas redes sociais.
Desta vez, o poema foi escrito nas montanhas ao sul da Polónia, em Bukowina Tatrzańska, na varanda do quarto 1308 do Hotel Harnaś.
Texto e fotos de José Luís Peixoto
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